REVISTA CASA D’ITALIA – Ano 05, nº39, 2024

Ano 05, nº39, 2024 – Edição ‘Relações Brasil x Itália’ – ISSN: 2764-0841

Editorial

É com imenso orgulho que celebramos a chegada do 39º volume da Revista Casa D’Italia, uma jornada cultural que se propõe a explorar e enaltecer as diversas manifestações artísticas e históricas que compõem a rica tapeçaria da experiência humana.

Inauguramos essa edição com uma profunda reflexão e Considerações sobre a Experiência Humana. Em tempos onde o presente parece mais efêmero do que nunca, é crucial olhar para trás, compreendendo as nuances que moldaram nossa trajetória. Mergulharemos nas águas da história com uma reflexão sobre os processos eleitorais do Império do Brasil, proporcionando uma análise crítica e esclarecedora.

Na sequência, celebramos a memória da primeira Festa Italiana de Juiz de Fora, a Festa D’Italia. Uma celebração que vai além das fronteiras geográficas e se torna um testemunho vivo da preservação e celebração das raízes culturais italianas em solo brasileiro.

Entre as páginas desta edição, destacamos também “Entre as linhas da poesia Romani”, onde a genialidade de Castro Alves e Cecília Meireles se entrelaça com a riqueza formada por um diálogo poético que transcende épocas e fronteiras, além de temas como “A representação do caipira”, “Irrupção na urbe: provocações no trabalho de M. Vinícius Amato” e “Arteterapia: a Arte como Ferramenta de Cura” e “Via Liberdade: Uma rota cujo nome já diz tudo!”.

Esperamos que esta edição da Revista Casa D’Italia seja uma fonte de inspiração, provocação e, acima de tudo, celebração da diversidade cultural que enriquece nossa sociedade. A cultura é um legado que transcende gerações, e é com grande alegria que continuamos a compartilhá-la com vocês.
Agradecemos a todos os escritores, leitores e nossos apoiadores do Apoia.se, que tornaram esta edição da Revista Casa D’Italia possível. Juntos, continuamos a construir uma plataforma que amplifique as vozes das mulheres e inspire a mudança. Aproveitem a leitura e que as histórias compartilhadas aqui motivem a busca por um mundo mais igualitário.

Boa leitura!

Editorial: Paola Frizero.


Primeira Festa Italiana de Juiz de Fora

Revista Casa D’Italia – Ano 5, n. 39, 2024 – ISSN: 2764-0841 | Juiz de Fora, Minas Gerais
Maria Clara Cabral | Primeira festa italiana de Juiz de Fora

Resumo: O presente artigo propõe mostrar como foi realizada a primeira festa italiana em Juiz de Fora, além de apresentar a importância de levar a cultura italiana para as pessoas, pois ela é uma cultura de herança.

Palavras-chave: Festa. Italianos. Cultura. Imigrantes.

Abstract: This article proposes to show how the first Italian party was held in Juiz de Fora, in addition to presenting the importance of bringing Italian culture to people, as it is a heritage culture.

Key words: Party. Italians. Culture. Immigrants. 

Riepilogo: Questo articolo si propone di mostrare come si è svolto il primo festival italiano a Juiz de Fora, oltre a presentare l’importanza di portare la cultura italiana alle persone, in quanto è un patrimonio culturale.

Parole chiave: Festa. Italiani. Cultura. Immigrati.

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Nos dias 14 e 15 de outubro, a Casa D’Italia celebrou a primeira festa italiana de Juiz de Fora, com músicas, gastronomia e cultura italiana.

A festa, planejada desde 2019 e adiada por conta da pandemia da Covid-19 e do isolamento social, superou as expectativas em número de público, com uma estimativa de mais de 2 mil pessoas entre sábado e domingo.

O projeto da festa começou depois de uma pesquisa inicial do produtor Arthur Maselli sobre suas origens italianas. Ele percebeu que na cidade não havia uma celebração da cultura italiana e, por ser publicitário e produtor, procurou unir o trabalho ao lazer.

Durante as 20 horas de festa, a cultura italiana pôde ser celebrada de diversas maneiras, com palestras, grupos de danças e músicas e “dança do vinho”. 

Grupo de Dança Folclórica Italiana Tarantolato
Foto: Iandra Lancort

Local da Festa

A primeira Festa Italiana de Juiz de Fora foi celebrada no Museu Ferroviário da cidade, um local completamente representativo para a cultura italiana, pois foi pela estação de trem que os imigrantes chegaram a Juiz de Fora.

Para o produtor da festa, Arthur Maselli, o local foi significativo: “O Museu Ferroviário fez todo o sentido, porque no museu tem um acervo permanente que conta a história do desenvolvimento da linha férrea, e essa história se assemelha com a história da chegada dos italianos, inclusive com a contribuição dos imigrantes”.

Para o presidente do Comites – MG (Comitê dos italianos residentes no exterior), Fábio Fasoli, a escolha do local foi assertiva, pois remeteu ao início da vida dos imigrantes na cidade: “O lugar [Museu Ferroviário] é o ponto de partida da festa. Isso já demonstra que [a festa] foi feita com sabedoria, carinho e dedicação”.

Idioma italiano

Um dos momentos da festa foi a palestra do professor, tradutor e mestrando[1]  da Universidade Federal Fluminense acerca de “um olhar sobre a literatura, a tradução e a língua italiana”, em que ele e Wellington Rodrigues abordaram a literatura da autora italiana Grazia Deledda.

A tradução conta sobre os problemas enfrentados pouco antes da Primeira Guerra, ou seja, um período de imigração massiva.

Além disso, a Itália estava recém-unificada e era um país em construção. Com isso, Deledda era inclusive uma imigrante dentro de seu próprio país, vivendo inúmeras dificuldades, como de comunicação, pois falava sardo.

Naquele momento não existia “italiano” e sim as línguas locais. Então, a dificuldade que ela sentia era a mesma que os imigrantes sentiram ao chegar no Brasil por não falarem português.

Por isso, para Denes[2] , é necessário olhar para a literatura, pois ela “está carregada de elementos da sua época, de características que foram dissolvidas pelo tempo”.

Na época da chegada dos imigrantes italianos ao Brasil, eles também não falavam italiano, e sim o idioma do local em que viviam. Por conta da unificação da Itália, era preciso um idioma para o país recém-formado, então ele foi criado em “laboratório”.

Para definir qual seria o idioma, os especialistas recorreram aos autores Dante, Petrarca e Boccaccio. Os três tinham uma preferência pelo toscano e pelo fiorentino e por isso formaram o idioma italiano.

Hoje em dia estuda-se esse idioma produzido, mas é preciso entender que cada região ainda tem suas particularidades. E é importante estudar italiano, pois é uma forma de resgate de cultura e de conversar com a própria história, como afirma o professor Denes: “É uma maneira de fazer uma reconciliação histórica e também uma reconciliação geracional, da própria identidade. Era a língua de que os antepassados sentiam saudade, em que realizavam matrimônios, juras de amor, xingavam, faziam as orações […] Era o que o povo tinha de união naquela época”.

Porém, tanto Denes quanto Paulo José de Barros, atual presidente da Casa D’Itália, acreditam que o idioma italiano não está universalizado entre os descendentes, já que muitos nem sequer têm a noção que descendem de italianos.

Palestra “Um olhar sobre a literatura, a tradução e a língua italiana
Foto: Iandra Lancort

Valorização da cultura italiana

O principal objetivo da Festa Italiana foi fazer o resgate da memória dos imigrantes e da identidade daquele povo. Para a fundadora do Departamento de Cultura, Paola Frizero, “é importante termos em mente que essa identidade é construída ao longo dos anos, não só por uma etnia, mas por várias que aqui estiveram, e esse resgate nos faz entender melhor sobre nossa cultura e costumes”.

O presidente da Casa, Paulo José de Barros, defende que a festa também foi para “resgatar a união entre os descendentes dos imigrantes, aumentar a participação e o envolvimento deles com a Casa, assim como era antigamente”.

Uma das maneiras de auxiliar no resgate da cultura italiana é através da oralidade, pois muitas histórias e tradições foram passadas pelas gerações e não estão descritas em livros.

Paulo José de Barros enfatiza que é preciso não deixar que essas histórias e memórias sejam perdidas ao longo do tempo. E, em um espaço como a festa, as pessoas podem compartilhar as memórias.

Para Fábio Fasoli, é necessária essa troca, esse momento de diálogo, já que as “histórias convergem, pois a matriz é a mesma. [a história oral]. É um elemento importante para descobrir as convergências do passado”.

Por conta disso, o Departamento de Cultura organizou, durante a festa, uma exposição de fotografias de familiares dos imigrantes italianos, justamente para incentivar o diálogo entre os participantes.

De acordo com Paola Frizero, essa exposição será feita novamente com mais famílias no espaço expositivo da Casa em 2024.

Da esquerda para a direita: Fábio Fasoli (presidente do Comites-MG), Rafael Moreira (Coordenador-geral da Revista Casa D’Italia), Arthur Maselli (produtor executivo da Festa D’Italia), Maria Rosario Barbato (Comites-MG), Paola Frizero (Paola Frizero Viagens / Revista Casa D’Italia)
Foto: Iandra Lancort

Relação entre Juiz de Fora e Itália

Fábio Fasoli e Maria Rosária Barbato (coordenadora do associacionismo) comparecem à festa apoiando e mostrando que o Comites-MG incentiva as iniciativas que promovam a italianidade em Minas Gerais.

Juiz de Fora é a segunda cidade do estado com maior número de descendentes de italianos, mostrando a necessidade de se fazer uma festa que promova a cultura italiana.

Fábio Fasoli ficou admirado tanto com a organização da festa quanto com os participantes, “[eu] encontrei uma comunidade pipocando, encontrei muitas pessoas com desejo, entusiasmo e brilho nos olhos de vontade de se conectar com a Itália, com a ‘casa-mãe’”.

O presidente do Comites-MG ressaltou a necessidade de unir os descendentes de italianos: “reconheci e valido a importância de encontrar uma comunidade viva, de jovens que querem se conectar com Itália”.

No primeiro dia, eles realizaram o “Due chiacchiere” para estimular os descendentes e quem gosta do idioma a conversarem em italiano, aproximando mais as pessoas da cultura.

A expectativa do presidente da Casa D’Itália é continuar com a festa, tornando-a tradicional na cidade, para mostrar a cultura italiana e levá-la para as pessoas, tanto para quem não é quanto para quem é descendente de italiano.


Maria Clara Cabral

Graduanda em Jornalismo pela Universidade Federal de Juiz de Fora. É membro do grupo de pesquisa Comunicação, Cidade e Memória (COMCIME)/UFJF e atualmente pesquisa os Cinemas de Rua de Juiz de Fora


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Os processos eleitorais do Império do Brasil

Revista Casa D’Italia – Ano 5, n. 39, 2024 – ISSN: 2764-0841 | Juiz de Fora, Minas Gerais
Érica da Cruz Rosa | Os processos eleitorais do Império do Brasil

Resumo: O presente texto tem como objetivo principal discutir a implantação da prática eleitoral na história do Império do Brasil.

Palavras-chave: Império do Brasil. Eleições. Cargos Eletivos.

Abstract: The main objective of this text is to discuss the implementation of electoral practices in the history of the Brazilian Empire.

Key words: Empire of Brazil. Elections. Elective positions.

Riepilogo: L’obiettivo principale di questo testo è discutere l’implementazione delle pratiche elettorali nella storia dell’Impero brasiliano.

Parole chiave: Impero del Brasile. Elezioni. Posizioni elettive.

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O estudo sobre eleições suscita muitas questões, já que essa prática política está presente, hoje, na vida de milhões de brasileiros e permite a escolha de representantes para diferentes cargos do Legislativo e do Executivo nas três esferas de governo: municipal, estadual e federal.

Nosso objetivo, neste texto, é indicar a prática eleitoral como expressão da cidadania política e explicar o funcionamento eleitoral nos anos iniciais do Império do Brasil, quando as eleições se tornaram recorrentes para a escolha de diferentes cargos eletivos.

A realização de eleições gerais para cargos eletivos de deputados, como conhecemos hoje, foi inaugurada como novidade política no Brasil nas primeiras décadas do século XIX, quando se implantou uma monarquia constitucional em 1822. Além de eleições para deputados, eram realizadas eleições para senadores, conselheiros provinciais e para a composição do tribunal do júri. Ademais, eleições para cargos municipais de vereadores e de juízes de paz também eram realizadas, seguindo as novas leis e a Constituição de 1824.

Além das eleições gerais e municipais, o período constitucional implicou a realização de eleições para os cargos de deputados provinciais, para a escolha de regentes e para a Guarda Nacional. 

As eleições gerais do Império eram indiretas, ao passo que as eleições municipais eram realizadas de forma direta. Os processos eleitorais do Império eram excludentes, visto haver atribuições de cidadania baseada no sexo, na idade e na renda anual.

Com relação à renda, as definições indicavam que, para ter direito ao voto nas chamadas eleições primárias, era necessária uma renda anual de 100 mil réis. Já nas eleições secundárias, o valor dobrava para 200 mil réis. Apesar de existir restrição de participação quanto ao censo (renda anual), Carvalho (2011) chamou a atenção para a ampla participação dos votantes nos pleitos eleitorais, possibilitada pelo fato de que grande parte da população ganhava mais do que o valor estabelecido para votação. Além disso, a lei permitia que analfabetos pudessem votar, ao contrário de alguns países da Europa.

Apesar de constituir uma novidade política para cargos eletivos de representação nacional, a prática eleitoral pode ser apontada como uma prática antiga realizada em diferentes tempos e lugares. Na história da administração portuguesa havia a realização de eleições para os cargos camarários em Portugal e em seus domínios no ultramar. As eleições antigas para cargos camarários seguiam os códigos previstos nas Ordenações Filipinas de 1603 (Carvalho, 2011).

Os estudiosos costumam apontar  que não era novidade a realização de eleições no chamado período constitucional, já que havia eleições realizadas no Brasil, durante o período colonial, para os cargos camarários. Porém, elas funcionavam a partir do escrutínio de pelouros, ou seja, nomes eram indicados e depositados numa urna e, de forma aleatória, sorteava-se um nome. Nesse tipo de categoria de escrutínio, o que prevalecia era sorte, sendo, assim, uma forma distinta da realizada durante o Império, baseada no alcance do maior número de votos para os diferentes cargos eletivos implementados naquele momento.

As primeiras eleições gerais do Império do Brasil foram realizadas em 1824 e em 1828. Antes da realização de eleições, o governo publicava instruções eleitorais que determinavam quando e como as eleições deveriam ser realizadas, qual o local de votação e a apuração dos votos. 

Os pleitos gerais foram regidos pela Constituição de 1824 e pelas instruções eleitorais de 26 de março de 1824 e de 29 de julho de 1828. Além do local de votação e o número de eleitos, essas instruções eleitorais apontavam o número de deputados e de senadores que deveriam ser eleitos por cada província. No caso da província mineira, a mais populosa do Império, foi estabelecido o número de 20 deputados e de 10 senadores eleitos para a província.

Durante os primeiros anos do Império, as dúvidas, os problemas e os conflitos que envolviam o tema eleitoral chegavam à figura do presidente da província e seu Conselho de Governo, criado por decretos em 1823. Ambos eram responsáveis por inspecionar as eleições na província. Muitas vezes, alguns casos poderiam percorrer outras instituições, sendo levados ao conhecimento das autoridades e instituições centrais (ROSA, 2022). 

No caso do funcionamento eleitoral no âmbito da província, as figuras locais, como párocos e autoridades eleitorais, recorriam às autoridades provinciais para os mais diversos esclarecimentos com relação às eleições. É o caso, por exemplo, da Câmara de Jacuí de Minas Gerais, que, em 17 de agosto de 1828, escreveu uma representação destinada ao vice-presidente da província, Francisco Pereira de Santa Apolônia, relatando as dificuldades de distância que os eleitores daquela vila enfrentavam para dar seu voto na Vila da Campanha. Segundo a câmara de Jacuí,

[…] a grande distância que tem desta Vila a da Campanha da Princesa, que foi eleita cabeça de distrito, para as eleições transatas donde se constam quarenta e dois léguas pelo menos, com grandes ribeiros, e rios navegáveis, o que muito impossibilita aos eleitores o cumprimento dos seus deveres, e por isso roga a Vossa Excelência […] para multiplicar os distritos eleitorais, nomear esta Vila para cabeça de distrito das eleições de seu termo […]1

A vila de Jacuí teve seu pedido atendido, visto que a instrução eleitoral de 29 de julho de 1828, publicada pelo governo central, concedeu aos presidentes das províncias o direito de ampliar o número de locais de votação (colégio eleitoral).

Nem sempre os casos chegavam a ganhar alguma resolução diante das instituições provinciais, já que, durante a existência dos conselhos provinciais, essas instituições não tinham o poder de legislar sobre os assuntos eleitorais e os demais assuntos tratados no interior dessas instituições.

Nesse sentido, as eleições para os cargos eletivos constituíram uma novidade no Império do Brasil, justamente num momento de construção do Estado nacional brasileiro, quando novas instituições e leis eram criadas nos espaços de representação nacional.

[1]  Arquivo Público Mineiro (APM). PP 1-33 Cx 96 doc 24.


Referências bibliográficas:

Carvalho, José Murilo de. 2011. “A involução da participação eleitoral, 1821-1930”. Em Perspectivas da cidadania no Brasil Império, 37-58. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.

Rosa, Érica da Cruz. 2022. Eleições, cidadania e práticas eleitorais na província de Minas Gerais (1824-1831). Dissertação de Mestrado, Instituto de Ciências Humanas, Universidade Federal de Juiz de Fora.


Érica da Cruz Rosa 

Doutoranda em História e mestra em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Bacharela e licenciada em História com habilitação em patrimônio histórico pela Universidade Federal de Juiz de Fora. Atua como pesquisadora discente do Núcleo de Estudos em História Social da Política (NEHSP/UFJF).

E-mail: erica.dcr@gmail.com


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Irrupção na urbe: provocações no trabalho de M. Vinícius Amato

Revista Casa D’Italia – Ano 5, n. 39, 2024 – ISSN: 2764-0841 | Juiz de Fora, Minas Gerais
Noah Mancini | Irrupção na urbe: provocações no trabalho de M. Vinícius Amato

Resumo: O presente artigo trata-se de texto crítico sobre o trabalho poético do artista M. Vinicius Amatto. A partir de uma breve reflexão sobre a importância de se pensar a cidade e a ocupação dela, será contextualizada e analisada a obra “Experiência entre Permanência e Apagamento” (2022), levando em conta os aspectos relacionais do trabalho com o espaço urbano, seguida de entrevista concedida à revista por parte do artista, falando sobre tal intervenção.

Palavras-chave: cidade; arte contemporânea; Juiz de Fora; intervenção urbana; colagem.

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A cidade é um organismo vivo. Modificada constantemente pelos seres viventes que nela habitam, é produto de sucessivas ações do homem no espaço. Por ele e para ele as cidades foram criadas. Ruas, viadutos, praças, prédios. Asfalto, grama, árvores, paralelepípedos. Pensar a urbe é pensar formas de nos relacionar com o espaço. Na urbanidade em sua totalidade, há mais lugares que não acessamos do que os passíveis de nosso trânsito. Como ocupamos ou somos capazes de ocupá-los? Quais barreiras e travessias neles coexistem? 

A memória da cidade, quando esquecida, gera a sensação de não pertencimento. Digo memória não só a história que nesse território passou, mas também a relação que criamos com o lugar que habitamos.  Quantas vezes não andamos pelas ruas, vislumbramos calçadas, prédios, esses abarrotados de transeuntes que seguem a vida corrida, displicentes ao tempo que os percorre? Esse tempo também percorre a urbe, a transforma, e solapa – por concreto em cima de concreto – suas histórias. 

A modernidade ocorreu intrinsecamente com a dissolução. Esse fenômeno marcou brutalmente a silhueta urbana. Basta se atentar para as mudanças ocorridas ao nosso redor ao longo do tempo. No caminhar, nos deparamos com os passantes – sejam eles vultos, rostos, de relance parte da composição urbana. Também nos deparamos com os edifícios, os muros, as grades, a construção civil em progresso, o abandono de espaços públicos e privados. Diante desse processo, constantemente nos espantamos com “o que foi”, “o que se tornou” com aquilo que existia sem antes termos nos dado conta. 

Em Juiz de Fora, como em muitas cidades do Brasil e do mundo (que competem entre si), o mosaico ardiloso visto na arquitetura parece brincar de desfazer e alterar as peças de lugar continuamente. A cidade move-se e nós viramos a esquina esperando encontrar algo, mas somos surpreendidos com uma nova farmácia, um apinhado e novíssimo conjunto residencial, uma agência bancária ou uma loja de bijuterias importadas.  A cidade não nos pertence. Ela transformou-se em uma tentacular criatura com desejos duvidosos, capaz de parir muitos andares. Sua prole, prédios espelhados, nos brindam com a colisão dos seus reflexos ao fim do dia. 

São os donos da grana do planeta, e ganham mais a cada minuto, espalhando shoppings pelo mundo. Espalham quase que o mesmo modelo de progresso que somos incentivados a entender como bem-estar no mundo todo. Os grandes centros, as grandes metrópoles do mundo são uma reprodução uns dos outros. (KRENAK, 2019, p. 11)

O trabalho de M. Vinicius Amato se aproxima dessas questões. Natural da cidade mineira de Ubá e residente na cidade de Juiz de Fora desde 2008, é graduado no Bacharelado Interdisciplinar em Artes e Design (2017) e no Bacharelado em Artes Visuais (2020), ambos pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Atualmente cursa mestrado no Programa de Pós Graduação em Artes Cultura e Linguagens (PPGACL) na mesma instituição. Tendo uma formação interdisciplinar, sua produção artística dialoga com a fotografia, a escultura, colagens e vídeo. Atualmente desenvolve pesquisa voltada para obras que se manifestem em lugares públicos, proposições que reclamam as incoerências da cidade. Amato também chegou a cursar Geografia pela UFJF, formação que exerce forte influência em suas expressões poéticas, na escolha de materiais e temáticas abordadas.

Neste texto chamo atenção para um trabalho em específico do artista mineiro, a instalação “Experiência entre Permanência e Apagamento” (2022). Trata-se de uma intervenção onde M. Vinícius dispõe bolas de futebol feitas de cimento em um amplo gramado, e ao lado coloca um jogo de totó. Tal obra conversa intrinsecamente com a paisagem e a história do desenvolvimento urbanístico do município. Pode ser considerada como um site specific, uma vez que é uma instalação pensada especificamente para o lugar onde foi realizada: trata-se da Curva do Lacet. 

Com a especulação imobiliária e o aumento de preços nos terrenos do bairro Cascatinha, a população que vive no Dom Bosco (um dos bairros mais antigos de Juiz de Fora) passou a ser empurrada pelos empreendimentos dos bairros vizinhos, que sofreram forte processo de gentrificação. Cada vez mais espremida no alto do morro, ao mesmo tempo que a população da comunidade convive com uma outra realidade socioeconômica, transita pelos mesmos espaços que os outros vizinhos, sujeitos esses pertencentes a classes sociais mais abastadas. A inauguração do Independência Shopping em 2008, primeiro grande shopping da cidade, fez esse espaço sofrer severas modificações.

Tais perdas mostram claramente a intenção de higienização do lugar, intensificando o conflito entre classes e, simultaneamente, tentando escamotear as diferenças através de um processo de retirada das estruturas coletivas e comunitárias, levando à perda do direito à cidade. (MONTEIRO, 2014, p. 149)

No ano de 2006, o local designado Curva do Lacet abrigava um campo de futebol de várzea e um parque de brinquedos destinado ao público infanto-juvenil. Contemplava copas esportivas regionais, frequentadas por associações de moradores, e outras atividades de lazer gratuitas. Com a chegada do shopping, o espaço passa por uma reconfiguração urbanística, onde todas essas utilidades são anuladas para dar espaço a um gramado vazio e de solo irregular, não mais plano, dificultando ainda mais a habitação do Lacet. 

A requalificação urbana da Curva do Lacet acabou resultando em uma área urbana gramada, porém vazia, cumprindo apenas o propósito de passagem, com a perda total de sentido que lhe era atribuído, bem como de suas funções. Dessa forma, o espaço deixou de ser apropriado e utilizado pela população, gerando, inclusive, sentimentos topofóbicos, de aversão à nova configuração espacial. Os impactos para a comunidade com a retirada do campo e do playground são muitos e negativos. (PEREIRA e PIVOTO, 2020, p. 154)

Na obra “Experiência entre Permanência e Apagamento” (2022), Marcos ativa possíveis memórias relacionadas à Curva do Lacet ao mesmo tempo que propõe formas de se habitar e pensar esse novo espaço, agora modificado por interesses escusos. As bolas futebolísticas de cimento não são tão jogáveis assim. Perde-se o caráter lúdico do objeto original para denunciar a asfaltização das cidades, a perda de espaços públicos de sociabilidade. Cinzas, duras e pesadas, parece ser o destino de toda cidade fadada ao glorioso progresso. Todavia um jogo de totó ali está, como quem diz: “olha o que estamos perdendo, mas olha o que também podemos fazer”. Na base do totó, onde estaria o campo onde as bolinhas rolariam chutadas pelos jogadores imóveis, ele imprime a imagem da Curva do Lacet, fazendo ela cenário da ação lúdica. Os espectadores passavam, fitavam as esculturas, e a expressão de curiosidade era nítida em seus rostos. Certas pessoas até se arriscavam a jogar uma partida em meio à correria que a cidade exige. A provocação está explícita, como podem objetos que não exercem a inicial função, se relacionam com o quê? Para quem se relacionava com tal lugar de passagem, ainda mais com a construção do Independência Shopping, primeiro grande shopping center da cidade, opera como um lapso de insurreição das desiguais e opressoras administrações de espaços comunitários e gratuitos.

Figuras 01, 02, 03 e 04 – Registros da instalação. Foto: M. Vinicius Amato.

Como o jogo, a obra de arte conhece um momento de invenção que libera as potencialidades da memória, da percepção, da fantasia: é a alegria da pura descoberta, que pode suspender as buscas intensas ou sobrevir num repente de inspiração: heureca! E como o jogo, a invenção de novos conjuntos requer uma atenção rigorosa às leis de sintaxe que correspondem ao novo esquema imaginário a ser realizado (BOSI, 1986, p. 16)

A intervenção na espacialidade urbana que M. Vinícius executa, nas instâncias antropomórficas, dialoga de alguma maneira com as assim feitas por construtoras, prefeituras e empreiteiras. Mas sua proposição poética aponta exatamente para as contradições desse modus operandi com a paisagem da cidade. Provoca o olhar ao explanar as inutilidades de um jogo quase impossível de se jogar. Bolas de cimento não servem para praticar futebol, assim como a curva do Lacet perdeu seu propósito para os citadinos. Qual a utilidade de um espaço público? Para quê e para quem serve?

Neste sentido, a escultura assumiu sua total condição de lógica inversa para se tornar pura negatividade, ou seja, a combinação de exclusões. Poderia-se dizer que a escultura deixou de ser algo positivo para se transformar na categoria resultante da soma da não-paisagem com a não-arquitetura. (KRAUSS, 1984, p. 133)

Em um momento do expressiva verticalização do município, de drásticas mudanças climáticas, é um compromisso pensar como tornar a urbanidade mais humana, uma vez que ela ocupa a paradoxal dicotomia entre o que é nosso, para nós, e o que vai além de nós, uma vez que não teria que ser assim. Problemas de planejamento que corroboram com um projeto de sociedade predatório e tão capitalista quanto contraproducente. A construção civil solapa, isso sem falar na nova Lei de Uso e Ocupação do Solo promulgada por governos municipais anteriores. Juiz de Fora parece travar tais embates polarizados constantemente, patrimônios históricos demolidos, o impasse da venda e/ou preservação da Mata do Krambeck, ou até a negligência com o Rio Paraibuna.

Na maior parte das vezes, a vitória continua sendo do governo e do mercado, onde, de mãos dadas, empurram a população, o meio, e o ambiente para último plano. Resta os agenciamentos coletivos e individuais, como a proposta de M. Vinícius, para lembrar de onde vem a cidade que também somos, e a quem serve o direito à cidade.

Entrevista com Marcos Vinicius Amato

A partir do interesse pelo trabalho de M. Vinícius e acompanhando sua pesquisa, me ative a alguns questionamentos e curiosidades que vejo em sua poética. Através de uma conversa virtual, o artista concedeu entrevista exclusiva à revista para falar sobre a obra.

Noah Mancini: Quais são suas motivações para executar tal trabalho?

M. Vinicius Amato: Essas proposições são provenientes da minha pesquisa de mestrado. Na curva do Lacet eu falo de uma dessas incoerências que a gente vê na cidade hoje em dia, né? Que é a segregação socioespacial. E a curva do Lacet é um exemplo muito grande aqui em Juiz de Fora, porque além de concentrar o campinho de futebol que era o campinho que atendia tanto a população do Cascatinha, do Dom Bosco, do Teixeiras, tinha esse convívio com a população do entorno. E depois que foi construído o shopping esse campo foi perdido. E não tem mais, não tem essa área de convívio. Isso afeta a localidade, né? E o bairro Dom Bosco foi o que mais sofreu com isso, porque um monte de projeto funcionava nesse campinho. Um dos exemplos é o Bom de Bola Bom de Escola, que era um projeto de futebol para criança e visava ocupar o tempo das crianças com atividades de lazer. E essa atividade foi perdida na localidade.

Outra motivação é pesquisar o campo “cidade”. Eu gosto muito da paisagem e do lugar na perspectiva de um artista, então eu penso isso também como um tema expandido, e como a gente vive numa cidade no mundo capitalista, sempre teremos esses problemas de segregação socioespaciais. Também coloco na minha pesquisa que pode ser um dos deveres da arte e das proposições visuais dialogar questões da cidade, essas incoerências, e essa parceria muito forte entre estado e mercado, sendo que muitas vezes o mercado dita como o estado vai agir. Falo um pouquinho de especulação imobiliária e falo de movimentos que já aconteceram no Lacet, porque eu não fui a primeira e nem serei a última pessoa – se Deus quiser, né? – que fez movimentos naquele lugar para contestar aquele espaço.

Eu mapeei um pouco desses movimentos. Em 2011 teve o Orangotango Slackline que se apropriou daquelas árvores do canto da curva do Lacet. Teve também a ocupação do espaço pelo coletivo Fora do Eixo em 2014 com o Ocupa Lacet na Semana do Audiovisual, do qual participei da organização quando integrava o coletivo. Em 2012 teve uma aula de um professor de arquitetura falando sobre o espaço social na cidade, aí ele ministrou essa aula na curva do Lacet.É um lugar que agora tem zero amabilidade, quase zero possibilidade de interação: ele funciona apenas como um espaço de função de ligar o bairro Cascatinha até o shopping e perdeu essa função social que os espaços dentro da cidade precisam ter.

Noah: O que te chamou atenção na interação dos transeuntes com essa intervenção que havia feito?

M. Vinícius: A recepção foi de certo incômodo por parte dos trabalhadores do shopping, mas também senti uma certa surpresa de quem passava e olhava para as obras; outros interagiam. Alguns transeuntes sabiam da história da curva do Lacet e lembravam na hora de quando abrigava o campo de futebol. As obras instaladas no Lacet também tiveram essa função de perturbar a ação compulsória de entrar e sair do shopping. E a reação de surpresa era esperada. Mas acredito que a ocupação cumpra a função quando os transeuntes param, mesmo que por segundos, para tentar entender o que aqueles objetos fazem ali.

Noah: Há outros espaços na cidade onde você apontaria essas contradições de segregação socioespacial em Juiz de Fora?

M. Vinicius: A segregação sócio espacial é repetitiva em cidades de distintas proporções; ela sempre vai existir de alguma forma por meio de outros elementos. Mas outro lugar que seja tão evidente quanto a curva do Lacet, aqui em Juiz de Fora não conheço.


Referências bibliográficas:

BOSI, Alfredo. 1986. Reflexões sobre arte. São Paulo: Editora Ática.

KRAUSS, Rosalind. 1984. A escultura no campo ampliado. Revista do Curso de Especialização em História da Arte e Arquitetura no Brasil. Rio de Janeiro: PUC-Rio. Tradução de Elizabeth Carbone Baez.

KRENAK, Ailton. 2019. Ideias para adiar o fim do mundo. 1.ed. São Paulo: Companhia das Letras.

MONTEIRO, Gabriel Lima. 2014. “Tinha uma pedra no meio do caminho, no meio do caminho tinha uma pedra”. O bairro Dom Bosco: uma longa vida comunitária e seus desafios frente ao avanço do capital imobiliário. 224 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Instituto de Ciências Humanas, UFJF, Juiz de Fora.

PEREIRA, Leandro Saar, e PIVOTO, Altair Sancho. 2020. “Planejamento Urbano, Turismo E Segregação Socioespacial: O Caso Da Curva Do Lacet Em Juiz De Fora, Minas Gerais, Brasil”. Turismo: Visão E Ação 22 (1):141-61.

Texto crítico baseado em conversa com a pesquisadora Camila Vitório Siqueira.


Noah Mancini

É Bacharel Interdisciplinar em Artes e Design pela UFJF, MBA em Comunicação e Marketing pela Descomplica e Mestrando em Cinema e Artes do Vídeo pela UNESPAR (Bolsista Fundação Araucária). Desenvolve seus trabalhos entre o texto, o corpo e a imagem


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A representação do caipira: uma análise sobre a obra “O Caipira Violeiro” de Maria Pardos

Revista Casa D’Italia – Ano 5, n. 39, 2024 – ISSN: 2764-0841 | Juiz de Fora, Minas Gerais
Aila Kathleen Sais | A representação do caipira: uma análise sobre a obra “O Caipira Violeiro” de Maria Pardos

Resumo: A proposta do artigo é abordar a construção dos estereótipos e imaginários ligados à identidade caipira, a partir da análise da obra “O caipira violeiro” de Maria Pardos. O objetivo é buscar compreender como a artista retrata a figura do caipira em sua obra, realizando um diálogo com a iconografia do tema.

Palavras-chave:caipira. violeiro. Imaginário. Maria Pardos.

Abstract: The purpose of this article is to address the construction of stereotypes and imaginaries linked to the country people identity, based on an analysis of the work “O caipira violeiro” by Maria Pardos. The aim is to understand how the artist portrays the figure of the country people in her work, through a dialog with the iconography of the theme.

Key words: country. Viola player. Imaginary. Maria Pardos.

Riepilogo: El propósito de este artículo es abordar la construcción de estereotipos e imaginarios vinculados a la identidad caipira, a partir del análisis de la obra “O caipira violeiro” de Maria Pardos. El objetivo es comprender cómo la artista retrata la figura del caipira en su obra, a través de un diálogo con la iconografía del tema.

Parole chiave: campesino. Viola. Imaginario. Maria Pardos.

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Pintora de origem espanhola e importante nome para a elaboração do Museu Mariano Procópio, Maria Pardos chega em territorio brasileiro em 1890. Também bailarina, Pardos recebe destaque no movimento nacional das artes pelo seu trabalho e por ter sido aluna de Rodolfo Amoedo.

Moradora da cidade maravilhosa, a pintora exibiu durante o período de 1913 até 1918 seus trabalhos na Exposições Gerais de Belas Artes do Rio de Janeiro, período este que suas pinturas foram ganhando mais notoriedade.

Pardos recebeu diversos prêmios, como menção honrosa de primeiro grau e algumas medalhas. Após a época citada, Maria Pardos se frustra com as premiações do EGBA e então encerra sua trajetória como artista, prosseguindo assim então como auxiliadora de Alfredo Ferreira Lage na elaboração do Museu Mariano Procópio.

Dada a breve apresentação bibliográfica da pintora, o objetivo do artigo é analisar a obra foco dessa escrita com o intuito de traçar como se dá a representação do caipira a partir do olhar de Maria Pardos, e como a obra dialoga com iconografia do tema.

A obra

Abordando a obra selecionada para a análise, “O Caipira Violeiro”, obra pintada por Maria Pardos, tem 88 cm de altura e 66 cm de largura, configura-se em uma pintura de gênero e dentre seus materiais está o óleo sobre papelão.

Figura 1 – Maria Pardos. O caipira violeiro. Óleo sobre papelão, 86 x 66cm. Museu Mariano Procópio (imagem do acervo online).

A obra apresenta um homem jovem, com vestes rasgadas, chapéu de palha na cabeça, cigarro na boca, camisa na cor rosa e calça e suspensórios brancos, sentado no chão de barro com muitas folhagens a sua volta e com os pés descalços. Segurando um violão como alguém que o estivesse tocando, ao lado estão alguns objetos, como o que parece ser uma garrafa de bebida alcoólica, fósforos e um maço de cigarros, que se distribuem aleatoriamente pelo solo.

O primeiro fragmento a ser analisado é a feição do representado: serena e despreocupada. Podemos associar à ideia que Monteiro Lobato, em 1914, lança como uma característica própria do caipira, levantando a tese de que o caboclismo, a mistura do branco com o indígena, gera um tipo de ser humano fraco, passivo e preguiçoso.

Na obra de Pardos, a feição do caipira nos transmite esse ar de passividade, de estar preso aos próprios devaneios, além do bigode por fazer, que pode ser sinal de desleixo consigo mesmo.

A obra elaborada por Pardos nos leva a uma cena cotidiana caipira. A partir do trabalho de Antônio Cândido (1964), podemos afirmar que a obra da pintora se encontra no eixo do lazer, pois a viola, que assina todo esse momento de tranquilidade expresso na obra, evidencia o momento ali vivido pelo caipira como um momento de descanso.

Como evidenciado por Diogo Silva Manoel (2016), é por meio do canto roceiro, do tocar da viola, que o caipira se expressa quanto a sua própria história, seu hábito de vida, sua cultura e seus ideais.

Na tela é evidente a escolha da autora por representar esse caipira com cor e traços semelhantes à natureza, técnica comum para tal prática. A cor da pele do homem é quase que do mesmo tom usado para pigmentar o caminho de terra. Os pés descalços, apresentados na obra, podem assinar essa concepção de não civilizado e de comunhão do indivíduo caipira com a natureza.

Hipótese

Teria Maria Pardos realizado uma pintura que antecedesse essa obra analisada? Como quem tem intuito de criar uma espécie de série sobre um mesmo personagem representado? Pois bem, ao visitar o Museu Mariano Procópio, nos deparamos com uma tela, também óleo sobre papelão, sem nome, que se assemelha bastante com o quadro “O Caipira Violeiro”.

Figura 2 – Sem Autor. Sem Título. Óleo sobre papelão. Museu Mariano Procópio (fotografia feita pela autora).

A obra sem título é também uma representação do caipira, onde vemos um homem capinando, de chapéu de palha e bigode, muito semelhantes ao primeiro quadro analisado. As roupas também são  idênticas às representadas na primeira obra aqui analisada: blusa de manga cor-de-rosa, suspensórios, calça branca, ausência de sapatos e, ao redor, muita vegetação.

E, novamente, as mesmas representações estereotipadas: as roupas rasgadas, a camisa aberta, o bigode por fazer, a semelhança de traços e tons com a natureza e os pés descalços.

Possivelmente estamos diante do mesmo caipira representado em duas obras diferentes. A segunda assina o eixo do trabalho, mostra o caipira concentrado em desempenhar sua atividade campesina. Já a primeira obra assinala o eixo do lazer, onde, depois do trabalho cansativo que realizou com suor e empenho, o caipira senta na estrada de terra que acabara de fazer, com seu violão, garrafa de bebida e  cigarro e ali descansa com sua viola.

Iconografia do tema

Ao buscar outras representações artísticas sobre a figura do caipira, podemos elencar algumas obras que podem dialogar com “O caipira Violeiro” de Maria Pardos.

A obra “Caipira Picando Fumo”, de Almeida Junior, é de 1983. A obra evidencia a figura de um homem de meia idade, barba e bigode por fazer, com o olhar voltado pro fumo que o mesmo está a picar.

Concentrado em sua atividade, enquanto carrega a palha sobre uma das orelhas, o representado veste uma camisa branca bem aberta, calça amarronzada mostrando seu tornozelo e evidenciando seus pés descalços, onde o mesmo se encontra sentado sobre pedaços de madeira, em frente de uma casa com porta de madeira e feita de taipa.

Outra obra de Almeida Júnior, “O violeiro”, a representação do caipira se faz presente. O homem toca a sua viola enquanto sua companheira põe-se a cantar. Com feições tranquilas, o casal aparenta partilhar de um momento de lazer. Tanto a obra “O caipira violeiro”, de Maria Pardos, e a obra de Almeida Júnior, “O violeiro”, retratam o caipira no eixo do lazer.

Figura 3 – Almeida Júnior, 1899. O violeiro. Óleo sobre tela, 141 x 172cm. Pinacoteca de São Paulo.

Nesta obra vemos um homem sentado na soleira de uma janela de madeira, vestindo camisa quadriculada, calça branca e chapéu verde escuro. Sua tonalidade de pele e a tonalidade das suas roupas funcionam harmoniosamente com a parte superior da parede branca. A camada de tinta da parede vai se descascando, dando lugar à parede de pau- a-pique, que contrasta com a segunda representada do quadro, uma mulher de pele mais avermelhada, camisa de um tom avermelhado, saia preta e um pano de prato que a mesma sobrepõe ao pescoço.

Portanto, o caipira violeiro dialoga muito com essas duas obras de Almeida Júnior, O violeiro no que tange o momento de abstração através da viola, e o caipira picando fumo no que tange o consumo do cigarro de palha como momento de relaxamento, também bem presente na obra de Pardos, onde o caipira também apresenta a roupa suja de terra, o que indica que ali fora exercido trabalho com a terra.

Conclusão

Podemos concluir que Maria Pardos, ao representar o caipira, faz escolhas representativas que reforçam alguns estereótipos acerca do modo de vida campesino, mostrando-se também conhecedora de outras obras acerca do tema, dado ao diálogo possível com algumas representações elaboradas por Almeida Júnior.

Elenco também a possibilidade de “O caipira violeiro” ser uma segunda obra de um mesmo personagem, dadas as semelhanças entre a pintura e a tela sem título exposta no Museu Mariano Procópio. Primeiro a pintura sem título, no eixo do trabalho, e “O Caipira Violeiro” assinando o eixo do lazer.


Referências bibliográficas:

Manoel, Diogo Silva. 2016. Comicidade e identidade na obra musical de Tião Carreiro: pagode de viola, cultura e identidade caipira no século XX. São Paulo: Unesp.

Cândido, Antônio. 1964. Os parceiros do Rio Bonito. Estudo sobre o caipira paulista e a transformação dos seus meios de vida. Rio de Janeiro: José Olympio.

Da Costa, Luciana Pereira et al. 2018. Uma abordagem iconográfica musical da obra O Violeiro de Almeida Júnior. Goiás: Revista Música Hodie.

Fasolato, Valéria Mendes et al. 2014. As representações de infância na pintura de Maria Pardos. Juiz de Fora: UFJF.


Aila Kathleen Sais

Licenciada em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e atualmente mestranda no programa de pós graduação de história pela mesma instituição. Lattes: http://lattes.cnpq.br/8546767020870527. E-mail: aila.kathleen@estudante.ufjf.br


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O mundo a posteriori:
considerações sobre a experiência humana

Revista Casa D’Italia – Ano 5, n. 39, 2024 – ISSN: 2764-0841 | Juiz de Fora, Minas Gerais
Ariel Montes Lima | O mundo a posteriori: considerações sobre a experiência humana

Resumo: Neste ensaio, abordo as complexidades da experiência humana no mundo, explorando a naturalidade com que percebemos nossa realidade social e cultural. Inspirada pela dicotomia de Kant entre conhecimento a priori e a posteriori, argumento que nossa vivência é forjada por uma racionalização cognoscente. Entretanto, questiono a artificialidade dessa realidade subjetiva. Concluo provocativamente, enfatizando a inexistência de universalidade e a natureza condicionada do ser, destacando a influência cultural na percepção e a impossibilidade de uma visão objetiva.

Palavras-chave: Experiência Humana, Conhecimento, Racionalização Cognoscente, Cultura, Percepção.

1. Introdução

A experiência de viver no mundo semiotizado da humanidade implica algumas percepções curiosas. Uma das mais interessantes é a noção de naturalidade presente no modo como — em um primeiro estágio, pelo menos — podemos observar o modo como os elementos constituintes de nossa organização social, psíquica, educacional, cultural e ideológica se estruturam na macroesfera do que entendemos como “mundo”. Digo naturalidade pela falta de um termo que permita uma nominalização mais apropriada do termo “apriorístico”, o que melhor descreveria essa percepção; isto é: de que o que existe hoje sempre foi assim como é. 

Diante disso, o presente ensaio pretende tecer algumas considerações acerca da relação perceptiva estabelecida entre indivíduo e realidade-mundo a partir da noção de anterioridade e primazia da experiência. Para tanto, parto do binômio proposto a partir da perspectiva racionalista acerca da existência de verdades a priori e a posteriori. 

A pesquisa aqui apresentada possui caráter teórico, tendo sido desenvolvida mediante pesquisa bibliográfica. 

2. Desenvolvimento

De acordo com Kant (1983), o conhecimento a priori caracteriza-se por ser um conhecimento independente da experiência empírica. Assim sendo, esse se destaca por ser conhecido antes da experiência sensorial. Já o conhecimento a posteriori se destaca por ser adquirido mediante experiência empírica. Dessa forma, esse é dependente da experiência sensorial.

Para melhor contextualizar o que afirmo, recupero as palavras de Hanna (2004, p. 358)

[…] uma proposição é a priori no sentido de ser semanticamente independente da  experiência  se  e  somente  se  nenhum  conjunto  particular  ou  espécie particular  de  experiências   sensoriais  é  necessário  ou  suficiente  para   a determinação  de  seu  conteúdo  semântico  (incluindo  especialmente  suas condições de verdade), muito embora sua geração cognitiva seja na verdade causalmente   associada   com   algumas   experiências   e   muito   embora   ela requeira,   como   uma   condição   de   sua   significação   empírica,   que   seja verificável por meio de algum conjunto ou espécie de experiências possíveis. (HANNA, 2004, p. 358)

Em outros termos, poderíamos, ainda, distinguir os conceitos a partir de certas diferenciações primárias; a saber: 1) as verdades a priori são consideradas universalmente válidas e aplicáveis. A validade dessas verdades é derivada da razão e da lógica. Essas, portanto, não dependem da observação do objeto referenciado. A proposição “Todos os homens são mortais” é um exemplo de conhecimento a priori, pois podemos entender isso sem a necessidade de observar todos os homens individualmente. 2) As verdades a posteriori são contingentes e dependem das condições específicas de observação. Aplicam-se a situações específicas e podem variar de acordo com a experiência. A proposição “A grama está molhada” é um exemplo de conhecimento a posteriori, pois é passível de transformação, dependendo da observação imediata da grama. 

Dessa forma, a experiência humana seria, a partir dessa percepção, intermediada por uma racionalização cognoscente, capaz de articular cadeias semióticas para propor fórmulas lógico-racionais, assim como deduzir a contingência particular aos estados transitórios de certos elementos e/ou situações. 

Sem embargo, a artificialidade da realidade representada pelo sujeito emerge como um problema às proposições axiológicas preteritamente citadas. Nas palavras de Ocker (2022b, p. 22), “os modelos ideais não pairam sobre nossas cabeças em um mundo de harmonia. Eles são construtos demasiado humanos. Demasiado tolos e demasiado vazios para valerem tanto. O mundo é, antes de tudo, a imagem de um mundo”.

O problema apresentado por Ocker diz respeito à impossibilidade da razão de conceber o mundo tal como ele seria, noção preconizada por Schopenhauer (2005). Lima (2023) acrescenta ainda que o mundo pode existir per se, embora o sujeito não tenha como comprovar a externalidade do real.  

A percepção do real, destarte, é condicionada. Há uma dupla articulação entre a vivência individual e o construto coletivo que antecede o sujeito. Nas palavras de Bakhtin e Volochínov (2009, p. 36),

a realidade ideológica é uma superestrutura situada imediatamente acima da base econômica. A consciência individual não é o arquiteto dessa superestrutura ideológica, mas apenas um inquilino do edifício social dos signos ideológicos.

Preliminarmente, portanto, separando os fenômenos ideológicos da consciência individual nós os ligamos às condições e às formas da comunicação social. A existência do signo nada mais é do que a materialização dessa comunicação. É nisso que consiste a natureza de todos os signos ideológicos (BAKHTIN; VOLOCHÍNOV, 2009, p.36). 

Supondo, desse modo, que o mundo exista, apesar do sujeito, é possível pensarmos que a experiência do sujeito parece exercer uma influência a priori para aquele que experimenta a realidade. É dizer: uma internalização do que a razão corrente naquela sociedade define como real. Todavia, tudo o que o sujeito recebe já existia antes de sua vivência, cuja execução foi realizada através da observação e contínuo desenvolvimento. Portanto, a suposta lógica racional não figuraria como nada além de uma cadeia de representações compartilhadas. 

A suposta transparência do pensar, por exemplo, é intermediada pelas representações linguísticas então empregadas (Ocker, 2022a). Falamos pelas palavras de outrem; “todo sujeito traz a carga de milhares de outros sujeitos que o precederam” (OCKER, 2022b, p. 22). Recuperando, uma vez mais, Bakhtin, é sabido que toda

obra é um elo na cadeia da comunicação discursiva; como a réplica do diálogo, está vinculada a outras obras-enunciados: com aquelas às quais responde, e com aquelas que lhe respondem; ao mesmo tempo, à semelhança da réplica do diálogo, ela está separada daquelas pelos limites absolutos da alternância dos sujeitos do discurso (BAKHTIN, 2006, p.279).

A cultura que nos engloba é a cultura de uma sociedade. 

não há cultura, nem elemento dela, que tenha caráter absoluto, que seja, em si e por si, a perfeição.  Será certa e boa para a sociedade que a vivencia e na medida em que nela se realiza e em que a exprime. Não há, pois, um padrão absoluto para julgar “a priori” o certo e o errado, o belo e o feio entre as culturas, pois cada uma traz em si mesma seu padrão de medida (MENESES, 2012, p. 06). 

A própria realidade material do mundo é anterior ao sujeito, a quem cumpre elaborar as percepções acerca do primeiro (MERLEAU-PONTY, 1997). Sobre a perspectiva de Merleau-Ponty, 

o mundo subsiste em si mesmo, eis uma tese que o fenomenólogo defende. Mas o caráter autônomo do mundo não decorre da possibilidade de que o ser do mundo pudesse exceder aquilo que se manifesta perceptivelmente, e sim do fato de que os eventos e coisas do mundo são compostos por uma infinidade de atributos e relações, as quais não podem ser todas apreendidas de uma só vez pela atividade perceptiva […] (FERRAZ, 2008, p. 1998).

Em suma, a identidade e a percepção são permeadas, atravessadas e estruturadas pela alteridade. Tudo parece a priori, embora seja a posteriori. Tudo é resultante de uma transformação contínua. 

3. Considerações finais

Ao fim do presente ensaio, apresento alguns tópicos, propositalmente provocativos, com vistas a sintetizar as conclusões resultantes do discutido neste texto. 1) Não existe universalidade. 2) A lógica é construto humano. 3) O ser é condicionado. 4) A humanidade é condição de percepção subjetiva.  


Referências Bibliográficas:

BAKHTIN, Mikhail. (VOLOCHÍNOV). Marxismo e filosofia da linguagem. Problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem Trad. Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 13 ed. São Paulo: Hucitec, 2009 [1929]

BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, Mikhail. In: Estética da criação verbal. Trad. Paulo Bezerra. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006, pp. 261-306 [1952-1953]. 

FERRAZ, Marcus Sacrini A. Sujeito perceptivo e mundo em Merleau-Ponty. DoisPontos, v. 5, n. 1, 2008. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/doispontos/article/viewArticle/11939. Acesso: 15 jan. 2024. 

HANNA, Robert. Kant e os fundamentos da filosofia analítica. Trad. de Leila Souza Mendes. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2004.

KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. Trad. de Valerio Rohden e Udo Baldur Moosburger. 2ª Edição. São Paulo: Abril Cultural, 1983. 

LIMA, Ariel Montes. O SENTIDO E SUA NATUREZA: uma busca por elos e palavras. Revista História em Curso, Belo Horizonte, Dez. 2023 –ISSN: 2178 -1044. Disponível em: Vista do O SENTIDO E SUA NATUREZA (pucminas.br). Acesso: 10 jan. 2024. 

MENESES, Paulo. Etnocentrismo e Relativismo Cultural: algumas reflexões. Revista Gestão & Políticas Públicas[S. l.], v. 10, n. 1, p. 1-10, 2020. DOI: 10.11606/issn.2237-1095.v10p1-10. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rgpp/article/view/183491. Acesso em: 14 jan. 2024.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Phénoménologie de la Perception. Paris: Gallimard, 1997. 

OCKER, Ariel Von. Ensaios Sobre Relativismo Linguístico.  São Paulo: Arche, 2022a.

OCKER, Ariel Von. Sínteses: Entre o Poético e o Filosófico. Belém: Worges, 2022b. 

SCHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e como representação. São Paulo: Editora Unesp, 2005.


Ariel Montes Lima

Mestranda em Estudos da Linguagem, pessoa não-binária, psicanalista e professora. Em 2022, publicou os livros Poemas de Ariel (TAUP), Sínteses: Entre o Poético e o Filosófico (Worges Ed.) e Ensaios Sobre o Relativismo Linguístico (Arche). Em 2023, lançou Poemas da Arcádia (Caravana). 


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Arteterapia: a Arte como ferramenta de cura

Revista Casa D’Italia – Ano 5, n. 39, 2024 – ISSN: 2764-0841 | Juiz de Fora, Minas Gerais
Isabel Noly | Arteterapia: a Arte como ferramenta de cura

Resumo: Este texto pretende trazer informações sobre o que é Arteterapia e como se dá o trabalho terapêutico em que a Arte é utilizada como ferramenta de cura. A escrita é dividida em tópicos, de forma didática, para que a leitura se torne eficaz e prazerosa. Quem o escreve parte da abordagem teórica Junguiana.

Palavras-chave: Arteterapia. Arte. Cura. Materiais expressivos.

Abstract: This text aims to provide information about what Art Therapy is and how therapeutic work takes place in which art is used as a healing tool. The writing is divided into topics, in a didactic way, so that reading becomes effective and enjoyable. Whoever writes it uses the Jungian theoretical approach.

Keywords: Art therapy. Art. Cure. Expressive materials.

Riepilogo: Questo testo si propone di fornire informazioni su cosa sia l’Arteterapia e su come si svolge il lavoro terapeutico in cui l’arte viene utilizzata come strumento di guarigione. La scrittura è suddivisa per argomenti, in modo didattico, affinché la lettura diventi efficace e piacevole. Chi lo scrive utilizza l’approccio teorico junghiano.

Parole chiave: Arteterapia. Arte. Cura. Materiali espressivi.

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Já imaginou um consultório terapêutico com atmosfera de ateliê, cercado por fios, tintas, telas, pincéis, gravuras, papéis, tecidos, lápis de cor e argila?

Esse é exatamente o cenário onde a Arteterapia acontece.

Bem-vindos ao universo da arte como linguagem expressiva capaz de acessar lugares internos onde as palavras não alcançam.

O que é Arteterapia?

Arteterapia é uma modalidade terapêutica que se utiliza das artes como ponte entre a vida interna e emocional do cliente e a materialização dessas questões através dos materiais artísticos, proporcionando que algo subjetivo e abstrato ganhe forma, cor, textura, cheiro e ritmo. Assim, o indivíduo consegue se aproximar de suas emoções, a fim de compreendê-las e elaborá-las. 

Uma determinada experiência emocional humana pode ser, ao mesmo tempo, extremamente presente na vida de uma pessoa, mas também distante e confusa, por envolver muitas facetas que, às vezes, são difíceis de serem compreendidas pela consciência por não seguirem uma lógica racional. A Arteterapia trabalha trazendo essas questões abstratas para o plano do concreto. Um cliente pode, por exemplo, representar sua angústia por um luto através de fios que se entrelaçam contando uma história até o momento em que um fio é interrompido e o outro fio precisa seguir sua jornada sozinho. Neste processo simbólico, existe um convite à ressignificação desse fio que foi interrompido pela morte.

É neste processo de contato com os materiais que o corpo começa a se expressar. Questões inconscientes vêm à tona, a racionalidade sai de cena para o espontâneo ganhar voz.

Nas palavras de Duchastel (2010), a exploração lúdica da arte visual, da música, da dança ou da arte dramática é um meio natural e acessível a todos de se liberar do peso dos não ditos e de permitir à consciência iluminar sua existência novamente. Ao expressar o que não saberíamos dizer de outra maneira e ousando reencontrar a espontaneidade da criança, os processos de cura são estimulados e sua vida é recolocada em movimento. 

Ao se falar em Arteterapia é possível perceber,então, que não se trata de artesanato. É comum a frase “bordar é minha terapia”. Na verdade, essa fala, muitas vezes, quer dizer: “quando eu bordo, esqueço dos meus problemas”. A diferença para a Arteterapia é que, aqui, o objetivo é justamente olhar para as questões que atravessam o cliente, que comprometem sua saúde mental, que trazem amarras e angústias. O trabalho é feito para dar sentido a essas questões, elaborá-las, manuseá-las de forma a ser possível enxergar diferentes perspectivas, curando dores, ressignificando momentos difíceis. Sempre com o objetivo final de promover bem-estar, saúde mental e qualidade de vida para o cliente. 

Para viver um processo arteterapêutico não é preciso ter habilidades manuais ou artísticas. Não existe uma obrigação em criar obras de arte técnica e estéticamente perfeitas. Ao contrário, os materiais artísticos se tornam cada vez mais expressivos quando encontram mentes e corpos espontâneos e livres de cobranças.

Quais as diferenças entre Arteterapia e Psicoterapia?

Uma das principais diferenças está na forma como a questão emocional é abordada e trabalhada.  De forma geral, a Psicoterapia trabalha a partir da fala do cliente. A atmosfera terapêutica acontece com o cliente e o Psicólogo sentados em poltronas, onde vão elaborar a demanda psíquica a partir da expressão (verbal e não verbal) desse cliente, da escuta do terapeuta e da troca que acontece no setting. Sem o objetivo de reduzir as múltiplas abordagens e atuações psicoterapêuticas, esse é, em geral, o cenário.

Quando falamos sobre Arteterapia, o cenário físico passa a ser algo mais parecido com um ateliê de artes. A sua volta estão materiais artísticos que serão manuseados durante a sessão conforme a necessidade terapêutica de cada cliente. A questão emocional a ser trabalhada é acessada a partir das artes. A importância da expressão verbal é menor, visto que o mais importante é a relação espontânea estabelecida entre o cliente e os materiais artísticos.

A Arteterapeuta e Psicóloga Eliana Moraes, fundadora e coordenadora do blog Não Palavra, traz um ponto que eu considero extremamente relevante pensando sobre as diferenças entre a Arteterapia e a Psicoterapia. Sobre clientes que estão vivendo um intenso momento de dor, como casos de depressão grave, períodos de luto pela perda de um ente querido ou pela dor de se lembrar de momentos traumáticos, ela diz que o cliente não suporta falar sobre sua dor por uma sensação de “colocar o dedo na ferida”. Eliana considera que para esse cenário a Arteterapia proporciona, com maestria e beleza, a possibilidade de o sujeito permanecer no processo terapêutico com o recurso da “não palavra” das diversas linguagens da arte. Através do contato com esta, o cliente vai se fortalecendo e acessando seu potencial de saúde e seus recursos internos que muito colaborarão para o enfrentamento de sua profunda dor.” (Moraes 2023).

Por fim, é importante dizer que para a Arteterapia acontecer é fundamental que dois pontos sejam atendidos: é imprescindível a presença de um profissional Arteterapeuta que tenha se formado em uma pós-graduação de Arteterapia, e também é muito importante que se crie uma relação com a arte produzida, no sentido de tentar compreendê-la. Como o processo arteterapêutico é um processo de expressão, muitas vezes atravessado pelo inconsciente, é fundamental que o Arteterapeuta e o cliente caminhem juntos na direção de compreender o que veio à tona em forma de símbolos  e o que isso quer dizer, com objetivo de integrar essa informação na consciência.

Encerro este artigo deixando como inspiração as palavras de Jung, citadas por Walter Melo na obra “Nise da Silveira”, de 2001: “Na medida em que conseguia traduzir as emoções em imagens, isto é, ao encontrar as imagens que se ocultavam nas emoções, eu readquiria a paz interior. Se tivesse permanecido no plano da emoção, possivelmente eu teria sido dilacerado pelos conteúdos do inconsciente. Ou, talvez, se os tivesse reprimido, seria fatalmente vítima de uma neurose e os conteúdos do inconsciente destruir-me-iam do mesmo modo. Minha experiência ensinou-me o quanto é salutar, do ponto de vista terapêutico, tornar conscientes as imagens que residem por detrás das emoções. (citado em Melo 2001, 93)

Deixo registrado que este tema é amplo e, por uma questão de estrutura do artigo, não foi totalmente abarcado. Coloco-me à disposição para continuar a conversa, inclusive tratando sobre outras nuances que não foram tratadas aqui.


Referências bibliográficas:

Duchastel, Alexandra. 2010. O caminho do imaginário: o processo de arte-terapia. São Paulo: Paulus.

Melo, Walter. 2001. Nise da Silveira. Rio de Janeiro: Imago.

Moraes, Eliana. 2023. Reflexões sobre a escuta arteterapêutica: a arte preparando o terreno da consciência. Blog Não Palavra. Belo Horizonte. Disponível em https://nao-palavra.blogspot.com/2023/08/reflexoes-sobre-escuta-arteterapeutica.html. Acesso em 12 jan 2024.


Isabel Noly


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Entre as linhas da poesia Romani: Castro Alves e Cecília Meireles

Revista Casa D’Italia – Ano 5, n. 39, 2024 – ISSN: 2764-0841 | Juiz de Fora, Minas Gerais
Edylane Eiterer | Entre as linhas da poesia Romani: Castro Alves e Cecília Meireles

Resumo: Pouco se fala das contribuições dos povos Romani, os Ciganos, na formação da identidade e das artes brasileiras. Castro Alves e Cecília Meireles são dois expoentes literários que podem ser o ponto de partida sobre os discursos acerca da memória, da identidade e da participação fundamental dos Romá para o Estado-nação do Brasil, afinal, esses povos estão no território nacional desde o século XVI e suas histórias seguem pouco visíveis.

Palavras-chave: História dos Ciganos. Romani. Literatura Cigana. Castro Alves. Cecília Meireles

Abstract: There are few texts on the contributions of the Romani people, the Gypsies, in the formation of Brazilian identity and arts. Castro Alves and Cecília Meireles are two literary exponents who can begin studies of discourses about memory, identity and the fundamental participation of the Romá in the nation-state of Brazil, after all, these people have been in the national territory since the 16th century and their history remain barely visible.

Key words: History of gypsies. Romaní. Gypsy Literature. Castro Alves. Cecília Meireles 


Embora a presença dos povos Romá ou Romani (ciganos) no Brasil seja anterior à chegada dos povos negros, em 1574, com o degredo de João Torres e sua família para o Maranhão, eles não aparecem como povos constituintes de nossa identidade nacional. 

Esse apagamento, esse silêncio, no entanto, não isenta da necessidade de pesquisa e conhecimento das contribuições deixadas pelos povos das etnias Romá nas artes, no vocabulário, nos hábitos, nas tradições e na literatura. 

Segundo a pesquisadora Cristina da Costa Pereira (1990), os Romani estiveram presentes na formação da identidade nacional, participando de embates ao longo do período colonial e até nos folguedos. Essas contribuições, contudo, seguem pouco conhecidas e ainda às margens da historiografia oficial.

O Brasil recebeu os Romani dos três grupos principais: Calon, Rom e Sinti, em momentos diferentes, sendo aqueles os pioneiros, especialmente no nordeste, onde se moldaram às novas terras e aos meios de vida sedentarizada. Foi o caso de Diogo Sanches, citado nas Denunciações de Pernambuco (1595 / 1984). O Calon se estabeleceu em Igarassu, em 1594, como “mercador de lógea de mercearia, sedentário e rico”.

A presença e o protagonismo das mulheres romani também datam do período colonial, de acordo com a documentação da Câmara Municipal de São Paulo de Piratininga, já que, em 1603, houve a concessão para a abertura de uma casa comercial em favor da Cigana Francisca Roiz, considerada a primeira comerciante de São Paulo.

No imaginário brasileiro, os Romani ocuparam o lugar do exótico, do outro, e, em grande medida, eram aqueles que deveriam ser evitados, sobretudo por carregarem os estigmas que recaem sobre o desconhecido. 

 Cabiam-lhes, desde o século XVIII, as pechas de ladrões. E isso para além do popular, sendo registrado de forma oficial nos dicionários: “Ciganos – nome que o vulgo dá a uns homens vagabundos e embusteiros, que se fingem naturais do Egito e obrigados a peregrinar pelo mundo, sem assento nem domicílio permanente, como descendentes dos que não quiseram agasalhar o Divino Infante […]” (BLUTEAU, 1712, p. 311-312). Ou ainda, na revisão do verbete, já no século XX: “Ciganos – raça de gente vagabunda, que diz que vem do Egito, e pretende conhecer de futuros pelas rayas, ou linhas da mão; deste embuste vive, e de trocas, e baldrocas; ou de dançar, e cantar […]. Cigano, adj. que engana com arte, sutileza, e bons modos” (SILVA, 1922, p. 396).

O estigma se manteve, por exemplo, em livros de referência da história nacional, como os textos de João Dornas Filho, sobre a presença desses povos em Minas Gerais, no qual a descrição dos Romá é dada como “gente aparentemente sem lei nem rei” (DORNAS FILHO, 1948).

Fato é que a diáspora dos Romani pelo Brasil ficou mais intensa a partir de 1686, quando a expulsão desses povos para as Américas passou a ser uma estratégia de Portugal para retirá-los de sua metrópole, apresentando Editos de Degredos para trabalhos nas galés ou enviando-os para as colônias, sendo os principais destinos, no caso do Brasil, as regiões do Maranhão, de Pernambuco e da Bahia.

Presentes, portanto, em todo o território nacional, os Romani geraram filhos ilustres para o país, como aponta o pesquisador Rodrigo Corrêa Teixeira, que afirma que, em 1830, chegou a Minas Gerais um Rom, vindo da Boêmia, à época império austro-húngaro, conhecido como João Alemão, mas cujo nome era Jan Nepomuscky Kubitschek, o bisavô do presidente Juscelino Kubitschek.

Na literatura nacional, os Romani inspiraram versos como os Boêmios, de Luiz Guimarães Júnior, que inaugurou o parnasianismo brasileiro, em 1880, com sua obra Sonetos e Rimas, de Acordo com a Academia Brasileira de Letras (2010). E também foram mote de escritos de Raul Leoni, em 1915.

Um dos primeiros poetas Romani foi Laurindo Rabelo, o “poeta Lagartixa”, que escrevia sobre seu povo. Mas há autores mais conhecidos e pouco falados como seus descendentes, como é o caso de Castro Alves, no séc. XIX, e de Cecília Meireles, no séc. XX. 

Antônio Frederico de Castro Alves (1847-1871), conhecido como Castro Alves, o Poeta dos Escravos, era filho de Clélia Brasília da Silva Castro, cuja família, Calon espanhola, veio em fuga para o Brasil. A jovem conheceu o médico e professor de medicina Antônio José Alves, de família Calon portuguesa, mestre em medicina na Faculdade de Salvador, Bahia, considerado historicamente o primeiro Romá com curso superior no país.

Castro Alves sabia de sua origem Calon e da trajetória de seus ancestrais, de suas dificuldades, perseguições e sofrimentos, o que, de certa forma, influenciou seu estilo de escrita e sua dedicação pela causa dos povos negros escravizados, sendo um dos mais conhecidos abolicionistas brasileiros.

Embora o autor não tenha textos explicitamente sobre os Romani, em alguns momentos é possível perceber características desses povos em sua obra, como analisado por Ivo Barbieri, na abertura de Espumas Flutuantes (1974, p. 7-20).

Quando Barbieri aponta, como traços da figura mítica do herói construído por Castro Alves, a predestinação e o individualismo que o confina à marginalidade, percebe-se no poema O Hóspede (1974, p. 94) a presença de um “herói maldito” que se reflete como um Cavaleiro Itinerante, que é, nas palavras de Barbieri, “apartado da sociedade e consubstanciado com a natureza, o estrangeiro que personifica a insatisfação do indivíduo sem esperança. Inscrita na testa a marca da maldição” (1974, p. 11).

Dentro dessa descrição, se observadas as características dos dicionários vigentes no Brasil e dos estigmas dos povos Romani, que Castro Alves bem conhecia, a semelhança entre personagem e realidade os aproximam, ainda que não haja uma indicação direta de que essas criações dos heróis marginalizados sejam inspirados em grupos dos Romá.

A análise do poema Pedro Ivo (1974, p. 49) traz um herói itinerante, solitário e misterioso, bem encaixado, mais uma vez, no arquétipo do homem livre, aproximando-se dos Romani. Se Pedro Ivo tem “Cabelos esparsos ao sopro dos ventos / olhar desvairado, sinistro e fatal”, torna-se muito próximo dos atributos dos Romá, que são considerados o lado sombrio dos homens ocidentais por estarem inseridos em um sistema próprio de códigos e valores. Ainda de acordo com Barbieri, “A grandeza romântica do herói maldito está em destacar a sua individualidade rebelde contra o conformismo do presente” (1974, p. 12). 

Eis, portanto, não só a semelhança entre as personagens de Castro Alves com os povos Romani, mas, em certa medida, com o próprio autor que também foi considerado o Poeta Maldito, cuja sensibilidade e discurso eram denúncias e traziam à tona o antagonismo entre a sociedade na qual vivia e sua poesia.

Outro expoente da poesia brasileira, Cecília Benevides de Carvalho Meirelles (1901-1964), era de origem Romani. Órfã desde os três anos de idade e criada pela avó materna, Cecília Meireles tornou-se uma das maiores escritoras do país e a primeira mulher Romá a receber um título de Doutora Honiris Causa, em 1953, por uma Universidade de Nova Delhi, na Índia. 

O reconhecimento de Cecília Meireles como escritora iniciou-se aos nove anos de idade, em 1909, por Olavo Bilac, à época inspetor escolar no Rio de Janeiro. Já em 1938, recebeu o prêmio Olavo Bilac, da Academia Brasileira de Letras, da qual nunca foi integrante, uma vez que a instituição só aceitava homens em seus quadros até 1977, quando Rachel de Queiroz tornou-se a primeira mulher empossada. 

Cecília foi professora e jornalista e escreveu para o Diário de Notícias, em 1930-31, tratando de questões de educação, teoria literária, literatura brasileira e folclore. Sua notoriedade chegou ao mundo, sendo traduzida em diversos países.

Pioneira, em 1934, inaugurou a primeira Biblioteca Infantil do Brasil, no bairro de Botafogo, na cidade do Rio de Janeiro, preocupando-se com a importância de se difundir a literatura desde cedo.

Entre seus pares, na literatura, não aderiu ao termo poetisa, autodenominando-se “uma poeta”, como nos versos: “Não sou alegre nem triste/ Sou poeta”. Tampouco se furtou a falar e a escrever sobre o povo Romani, fazendo a temática bastante presente em suas obras.

Nos versos: “A tua raça de aventura/ Quis a terra, o céu, o mar. / Na minha, há uma delícia obscura/ Em não querer, em não ganhar./ A tua raça quer partir,/ Guerrear, sofrer, vencer, voltar./ A minha, não quer ir nem vir./ A minha raça quer passar”, a poeta deixa explícitas as características errantes de seu povo e o contrapõe com os gadjés (não-romá), especialmente no que diz respeito aos valores.

Há ainda o poema Canto Cigano, em que se percebem semelhanças entre a descrição da autora e Castro Alves: “Seus cabelos,/  Balançavam com o vento”. Essa sensação de liberdade metaforizada através dos cabelos desgrenhados e/ou ao vento acompanha o imaginário acerca dos Romá em grande parte da literatura.

Cecília vai mais longe quando descreve o seu povo como em Olhinhos de Gato: “– Quem qué lê sorte? Diz tudo: passado, presente e futuro! Esvoaçavam os lenços amarelos, os aventais vermelhos, as saias cheias de ramagens […]” (MEIRELES, 1980). A obra é uma narrativa da infância de uma menina na qual há presença do povo Romani, havendo a possibilidade, segundo Pereira (2009), de que possa ser um livro de memórias da própria Cecília.

Castro Alves e Cecília Meireles, além de uma ancestralidade comum, já que ambos eram do grupo Calon, deixaram suas contribuições como expoentes na poesia brasileira e, apesar de seus reconhecimentos, ainda há pouco sobre suas identidades, mantendo um silêncio sobre a importância dos Romani na formação da nacionalidade brasileira. 

Talvez sejam eles o ponto de partida para se reconhecer tamanha participação dos Romá na História do Brasil e se reverem os discursos da formação da identidade brasileira.   


Referências bibliográficas:

CASTRO ALVES, Antônio Frederico de. Espumas Flutuantes. com um estudo de Ivo Barbieri. Rio de Janeiro: Editora Expressão e Cultura, 1974.

FILHO DORNAS, João. Os Ciganos em Minas Gerais. In: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais. Belo Horizonte, ano 3, vol. III: Movimento Editorial Panorama, 1948, p. 137-186.

GUIMARÃES JÚNIOR, Luís, 1847-1898. Sonetos e rimas / Luís Guimarães Júnior; apresentação, Gilberto Araújo. – Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Letras, 2010. 266 p.; 21 cm. – (Coleção Afrânio Peixoto; 93) 

MEIRELES, Cecília. Olhinhos de gato. São Paulo: Moderna, 1980

MENDONÇA, Heitor Furtado de. Primeira Visitação do Santo Officio ás Partes do Brasil -Denunciações da Bahia, 1591-93. São Paulo: Ed. Paulo Prado, 1925.

MELO, Erisvelton Sávio Silva de. Sou cigano sim! Identidade e representação: uma etnografia sobre os ciganos na região Metropolitana do Recife-PE. Dissertação (mestrado) – Universidade Federal de Pernambuco. CFCH. Antropologia, 2008. Disponível em: <https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/479>. Acesso em 15 de nov. 2023.  1885. 

MORAIS FILHO, Alexandre José de Melo. Cancioneiro dos Ciganos: poesia popular dos ciganos da Cidade Nova. Rio de Janeiro: Garnier, 1885. Disponível em:

PEREIRA, Cristina da Costa. Os Ciganos Continuam na estrada. Rio de Janeiro: Ribro-Arte, 1989.

PRIMEIRA visitação do Santo Ofício às partes do Brasil; Denunciações e Confissões de Pernambuco 1593-1595 . Prefácio de José Antônio Gonsalves de Mello . Recife, FUNDARPE . Diretoria de Assuntos Culturais, 1984. 509 +158p . il . (Coleção pernambucana — 2a. fase, 14) . 1a. edição conjunta fac-símile das edições de 1929 “Denunciações de Pernambuco 1593-1595” e de 1970 “Confissões de Pernambuco 1594- 1595” . Nota introdutória de Leonardo Dantas Silva. 

TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. Ciganos em Minas Gerais: uma breve história. Belo Horizonte: Crisálida, 2007.


Edylane Eiterer

É historiadora (UFJF), especialista em Patrimônio Cultural e Metodologia do Ensino de História, mestre em Educação com ênfase em Políticas Públicas para o Patrimônio Cultural, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Juiz de Fora e atua na área de Consultoria em Pesquisa Histórica e de Educação Patrimonial, além de ser professora da rede municipal de ensino de Juiz de Fora e pesquisadora e professora de Culturas e Danças Ciganas.  edylaneeiterer@yahoo.com.br


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Via Liberdade: Uma rota cujo nome já diz tudo!

Revista Casa D’Italia – Ano 5, n. 39, 2024 – ISSN: 2764-0841 | Juiz de Fora, Minas Gerais
Marcio Roberto Ferreira Ribeiro | Via Liberdade: Uma rota cujo nome já diz tudo!

Via Liberdade: Uma rota cujo nome já diz tudo!

Uma palavra marcada na nossa bandeira, um sentimento, e agora, o maior caminho turístico e cultural do Brasil. Por aqui, a Liberdade sempre teve status de palavra-chave, e agora, com a via batizada em sua homenagem, fazemos questão de apresentá-la para quem é apaixonado pelas Minas para encantar-se cada vez mais pelas Gerais. 

Conhecendo a via Liberdade 

A Via Liberdade é uma iniciativa do destino Minas Gerais, em parceria com Goiás, Distrito Federal e Rio de Janeiro, o que a torna ainda mais interessante e completa. O trajeto de 1.179km engloba todo o percurso da rodovia BR-040.

Em todo o percurso, o turista tem a liberdade de escolher o que mais o atrai. Na faixa que cobre Minas Gerais, há desde aventura e contato com a nossa exuberante natureza até experiências criativas e inspiradoras, passando pelos deliciosos sabores da cozinha mineira e pela rica cultura regional. Por aqui, são centenas de municípios, mais de 2.000 atrativos, mais de 20 parques, entre nacionais, estaduais e municipais, além de outras áreas de conservação ambiental e bens tombados como Patrimônio Cultural da Humanidade reconhecidos mundialmente. 

Acolhimento: Um elemento à parte na Via Liberdade

O turista encontrará também na rota turística um povo acolhedor e hospitaleiro, como enfatiza a Traveller Review Awards 2021, da Booking.com, que elegeu Minas Gerais como uma das dez regiões mais acolhedoras do mundo, em 2021. 

O jeito mineiro, nossos modos de fazer, falar, nossa singularidade são expressões máximas que traduzem o que é ser a gente e viver a nossa liberdade, para exaltar essas características, usamos o termo mineiridade, um elemento à parte ao se viajar por Minas, e que pode ser observado em todas as experiências e vivências ao longo da via liberdade. 

Roteiros e Experiências na Via Liberdade

Mais de 100 roteiros e experiências estão disponíveis para os turistas que desejam conhecer melhor o que a via tem para proporcionar. São opções para todos os gostos, os apaixonados pela boa comida vão se deliciar com os premiados queijos mineiros, nossas quitandas, cafés especiais, cervejas, cachaças e tudo o que há de mais típico nos territórios mineiros. E engana-se quem pensa que só a boca trabalha por aqui,viu? Os 5 sentidos são estimulados, além do turista poder ter um contato direto com a história e aos locais de cultivo. 

A cultura não poderia ficar de fora, e, nesse sentido, são oferecidos roteiros que perpassam por 3 bens tombados como Patrimônio Cultural da Humanidade reconhecidos pela UNESCO: Ouro Preto, Santuário do Bom Jesus de Matosinhos em Congonhas e o Conjunto Moderno da Pampulha em Belo Horizonte. Além de passarem pelas cidades e vilarejos coloniais e imperiais, também conhecidas como cidades históricas, contemplarem manifestações culturais, visitarem museus, compartilharem a vivência em vilarejos e muito mais. 

Na Via Liberdade o turista pode ter experiências únicas, como, por exemplo,  conhecer melhor a jornada de Guimarães Rosa, principal escritor nacional do século 20, e adentrar no sertão mineiro. Ou de exercitar a criatividade através de uma visita ao Inhotim, o maior museu a céu aberto do mundo e logo depois pintar uma peça de cerâmica, é a liberdade de se inspirar pelo caminho que trilhar! 

Para manter o corpo em movimento, a resposta está na nossa natureza, são opções de tirar o fôlego e, no mesmo instante, devolver o ar, afinal, a caminhada não pode parar! São paisagens, cachoeiras, montanhas, grutas, com atividades de caminhadas, trilhas, cicloturismo e muito mais. A 123 km de Belo Horizonte, o município de Santana do Riacho é um verdadeiro refúgio para os amantes do contato com a natureza, e só mais uma das inúmeras opções que a Via propicia. 

Como deu para perceber, a Rota Via Liberdade oferece uma vasta opção de possibilidades ao turista que deseja conhecer o povo mineiro na sua essência, contemplar a  nossa cultura, natureza e vivenciar as mais imersivas experiências e se aventurar pelo nosso território. É Minas, compartilhando a nossa liberdade e abrindo os braços ao Brasil e ao mundo. 


Marcio Roberto Ferreira Ribeiro

(SECULT)


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Autores:
Maria Clara Cabral
Érica da Cruz Rosa
Noah Mancini
Aila Kathleen Sais
Ariel Montes Lima
Isabel Noly
Edylane Eiterer
Marcio Roberto Ferreira Ribeiro

Arte da capa:
Samara Danelon

Revisoras:
Tássia Souza
Ana Lúcia Jensen

Projeto Gráfico:
Rafael Moreira Teixeira

Coordenação Geral:
Rafael Moreira Teixeira

Edição:
Paola Maria Frizero Schaeffer

Site:
Thaiana Fernandes Pinto Gomes

Mídias sociais:
Rafael Moreira Teixeira

Diagramação:
Thaiana Fernandes Pinto Gomes

Captação e edição de áudio e vídeo:
Vinícius Sartini da Silva

Realização:
Duplo Estúdio de Criação
Departamento de Cultura da Associação Casa de Itália

Periodicidade:
Mensal

ISSN: 2764-0841